Verde de Scheele, pigmento mortífero usado na Era Vitoriana - Hoje São Paulo
São Paulo, SP, 25/04/2024
 
30/11/2015 - 16h48m

Verde de Scheele, pigmento mortífero usado na Era Vitoriana

Juliana Lopes 
Georg Friedrich Kersting [Public domain], via Wikimedia Commons
A Bordadeira, 1817. Pintura de Georg Kersting, atualmente propriedade do Museu Nacional da Varsóvia.
A Bordadeira, 1817. Pintura de Georg Kersting, atualmente propriedade do Museu Nacional da Varsóvia.
  • Design original do papel de parede Trellis, desenvolvido por William Morris. O artista fez uso de pigmentos à base de arsênico para criar verdes bonitos e duradouros.

São Paulo (Agência Hoje/Juliana Lopes) - Talvez graças ao período Neoclássico, que estendeu do século XVII até o início do XIX com sua aspiração bucólica, a cor verde foi uma verdadeira febre na Era Vitoriana. Por séculos, os pigmentos verdes mais utilizados haviam sido o azinhavre e a malaquita, porém estes não proporcionavam cores muito intensas e, portanto, não supriam satisfatoriamente as demandas da época.

Somente em 1775 o químico sueco Carl Wilhelm Scheele, ao estudar compostos arsênicos, descobriu o arsenito de cobre. Esta substância possibilitava a criação de um pigmento verde de cor intensa e duradoura, que ficou conhecido principalmente como verde de Scheele – o Scheele's green.

Logo a notícia do pigmento se espalhou pela Europa e ganhou novas fórmulas e versões, uma delas sendo patenteada na Inglaterra em 1918 e chamada de patent green. A proporção entre cobre e arsênico usada na preparação resultava em diferentes tons de verde, conhecidos por diversos outros nomes: verde mineral, verde montanha, verde Paris. A diversidade de nomes dados a cores derivadas de uma mesma substância, porém, talvez tivesse motivos mais obscuros.

A cor tão almejada trazia consigo o perigo do arsênico, extremamente nocivo e já naquela época utilizado na composição de venenos para exterminar ratos. De fato, ao longo do século XIX surgiram inúmeros relatos de pessoas tendo sua saúde negativamente afetada por consequência do pigmento verde, que chegou a ser chamado de "a cor da morte".

O verde de Scheele era amplamente utilizado no tingimento de roupas, fabricação de tintas para pintura de quadros, móveis e brinquedos infantis, velas de cera e principalmente para colorir os papéis de parede tão populares nas residências vitorianas.

Os relatos de vítimas variam desde adultos que se sentem mal ao respirar os fumos de uma vela verde até crianças que padecem após levar à boca um brinquedo colorido com arsênico. Pessoas frágeis tinham maiores chances de ser afetadas, e os sintomas incluíam tonturas, mal-estar, cansaço, dores e irritações cutâneas.

O maior vilão, porém, talvez fosse o papel de parede. Em um ambiente úmido e portanto propenso ao mofo, reações químicas poderiam liberar gases tóxicos do pigmento. A popularidade do papel verde só aumentava o número de vítimas.

Com o tempo, a mídia passou a alertar os consumidores sobre os perigos da moda do verde. Livros da época, especializados no cuidado com o lar, alertam expressamente as mães para que não vistam seus filhos de verde ou pintem seus quartos nessa cor, a fim de preservar a saúde e bem-estar das crianças.

A própria Rainha Vitória, ao saber que um nobre visitante passara mal ao deitar-se em um quarto de visitas recoberto com papel de parede verde, ordenou que esse tipo de cobertura fosse completamente removido o palácio de Buckingham.

Uma indústria tão lucrativa como a que produzia o Scheele's Green não se deixaria facilmente vencer pela população preocupada com a saúde pública. A própria extração de minérios para a produção de arsênico oferecia grandes danos à saúde dos funcionários e enorme poluição, com repercussão até os dias de hoje.

William Morris, um dos fundadores do movimento das Artes e Ofícios, defensor do Socialismo e do meio ambiente, era também um renomado artista na produção de papéis de parede e financiava sua marca através da Devon Great Consoles, uma grande companhia de mineração da época, preferindo ignorar as evidências dos danos causados.

Ao passar do tempo, a pressão dos consumidores e a descoberta de novos pigmentos, com menor nível de toxicidade e cores igualmente belas, o verde de Scheele foi substituído e deixou completamente de ser usado. No entanto, ainda hoje podem ser encontrados resquícios do veneno em fragmentos e peças de época.

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